@palivre

quarta-feira, 21 de abril de 2010

assim como se nada #18


NÃO HÁ NADA MAIS BONITO DO QUE UM RELÓGIO PARADO
imagem de heiko windisch



Caríssima Engenharia Laranja,

É com raro prazer que lhe escrevo agora. Mas saiba também que não há uma razão propriamente dita para isso, a não ser um tal convite lançado ao vento que acabou chegando aqui.

Assim meio que sem motivo especial, venho falar do que ando vendo e tendo oportunidade de ler. Sobre o que é possível se sentir hoje em dia.

Escrever agora é como fazer música. Há uma boa dose de dó ré mi em tudo isso. Pude ter certeza de que estávamos compondo juntos aos poucos, conforme as palavras saíam e cediam lugar para o vazio magnificamente esplêndido do silêncio.

E que sol absurdo, lá presente na janela, uma aquarela completa em si mesma, realizada, em cada tom e semitom. Escutando os passos, os compassos, reverterem a vida dos ponteiros do relógio. Não há nada mais bonito do que um relógio parado. Ele para para ver a vida. O relógio para para ouvir a música.

Amiga Engenharia, Comadre Laranja, e uma série de nomes que damos pra nós mesmos, a vida de palavra é mérito, acordo mútuo, mistério explícito, devoção verbal. Do início das coisas ao dito fim, quem se importa com isso? Ordenando letras, desordenando frases, desentupindo canetas, digita(liza)ndo!

O melhor de se sonhar palavra é a coisa da linguagem. Tudo se transformando. O passar do tempo virando passado junto com ele. O futuro que nunca chega. Aprofundando na linguagem o universo é ínfimo frente à imensidão do verbo. Um amor que se consome a si mesmo. Some a isso um exagero e suma daqui.

É assim a palavra dos novos tempos que nunca hão de chegar. Dar vazão ao não, ao sim, ao seja lá o que for e ao é assim que vai ser porque é. Simples metáfora de uma existência refletida em cartas, versos, universos e crônicas. Quem se importa mesmo com a regra por trás de uma palavra morta? Que trata tudo como um significado estabelecido e definido?

Redefinindo a ordem, o coro, quebrando o decoro, tomando as rédeas. Os donos da palavram falam agora, que é o único tempo onde se pode falar. Digam o que quiserem, porque o silêncio é maior. E há de abafar tudo quanto não for verdadeiro e real.


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