@palivre

quarta-feira, 27 de maio de 2009

musinematura #5


BARO : HABIB KOITÉ & BAMADA



Meio rumba, meio mambo. Meio misto de mulambo com escambo. Meio cravo num campo de rosas, meio escravo em total liberdade. Meio favo coberto de mel. Baro é o instrumental de uma ancestralidade viva, rebuscado como palavra escrita nas folhas do papiro e renitente como pinturas rupestres na pedra da caverna. A lanterna de fogo, a grande tocha, iluminando a rocha gigante que serve de palco para os descendentes do ontem criarem o hoje.

Diretamente de Mali, na região noroeste da África, para todos os ouvidos sintonizados na freqüência do planeta música. Não há como passar despercebido. Com uma sonoridade que se espalha audição adentro em direção aos confins mais absolutos da matriz perceptiva, Habib Koité & Bamada nos levam para uma viagem rítmica pelas raízes do nosso próprio ser.

Frutas, sol, árvores, vento, água. Paz, alegria, diversão, contemplação. Paralelo sonoro de imagens decoradas com a abundância de um olhar para o orgânico. Um mundo com tempo de sobra para celebrar a vida. Uma vida com sobra de espaço para preservar o mundo. Quantas associações positivas podem ser feitas ao escutar Baro? Certamente uma pergunta sem resposta frente à infinidade de caminhos e à infinitude de sentimentos que sua música é capaz de despertar.

Estamos tratando de flores, pérolas e cristais. A resplandecência de Habib Koité se mostra em cada acorde, ritmo e faixa desse exótico disco, composto com singular destreza e exatidão. Não há como tirar nada de Baro. Todo seu conteúdo se encontra em total harmonia, milimetricamente concatenado para formar um retrato sonoro da perfeição.

Sábios são os que reconhecem a natureza como mãe dos sons. Esses se transformam em pais, e usam os sons para recompor a natureza, reformando as formas, redefinindo as definições. Mas tudo no campo da instrumentália musical. Em Baro, Habib Koité & Bamada deixam registrada a certeza de que o homem está cada vez mais perto do encontro com si mesmo.

De canção em canção, um salto. E num ponto alto do disco, surge Baro, faixa sete, tema da obra, estrelando e ilustrando maravilhosamente bem as intenções de um grupo que se dedica unicamente a expressar a vida. O que é belo há de ser cantado, já dizia o poeta popular. Sabendo por experiência que o único lar real é o mundo, e tudo que o rodeia é pura matéria-prima inspirativa para uma nova canção.

Escutar Baro dá sorte. Vai dizer que treze faixas super harmonizadas reverenciando as grandezas do universo não são um bom presságio? Batoumambe, Kanawa, Wari, Sin Djen Djen, Cigarette Abana, Woulaba, Baro, Sambara, Roma, Tere, Mali Sadio, Takamba e Sinema Denw.

Flautas fantásticas, violões magníficos, percussões monumentais. Habib Koité & Bamada merecem o devido reconhecimento pela produção de um disco tão repleto de qualidades. Mesmo listando todos os adjetivos que a nossa escrita tem à disposição, ainda não há condição de definir com verossimilhança os movimentos da dança que Baro faz acontecer.

Ainda assim, alguém pode se atrever a dizer que Baro é um convite ao silêncio. Aquela pausa na fala e no pensamento que permite trazer sem obstáculos para dentro o encantamento melódico provindo de fora. Tipo um lugar onde nada demora, porque tudo é parte do mesmo tempo. Sem documentos, ressentimentos ou julgamentos, Baro é simples brincadeira musical levada a sério. A trilha sonora do encontro entre o mistério e a luz.



Batoumambé // Baro


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