@palivre

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

conta outra #8


SOBRE ACHISMOS, VIRTUOSFERA E ELEIÇÃO
imagem de gary taxali



O mundo de hoje não tem tempo a perder com conversa mole e papo furado. Não admite candidato sem partido nem bandeira sem nação. Hoje o mundo é uma mistura de desilusão e desencantamento. É tanto sofrimento que não há mais lugar. O problema de espaço é uma questão séria. E das mais relevantes.

Numa conversa com um amigo, que me apareceu dessa vez divulgando seu blog via msn, revelei minha imensa vontade de ver mais criação sua no blog que ele mantém. Menos reprodução alheia, menos repetição de conteúdo e mais do que ele escreve. Ele me disse que o propósito do seu blog não é esse. Que a literatura precisa de espaço. “Melhor escrever um livro”, disse ele.

Foi aí que eu entrei. Que portal fantástico. Uma viagem alucinante pela miopia humana. Como assim o blog não tem espaço? Seria a internet um apartamento de dois quartos? Não, é claro que não. A internet é justamente onde percebemos a fragilidade dos limites. É onde as noções de tamanho e capacidade ganham novas dimensões. O que são os limites na internet, se estamos falando de rede? Se falamos de conexão e compartilhamento, onde acaba o espaço?

Que eu saiba a internet é um espaço sem fim. É a própria tentativa de reproduzir o infinito. O Google prova que o universo está em expansão e não pára de crescer. O Gmail acompanha a evolução do cosmos e a cada dia ocupa mais e mais gigabytes na virtuosfera. O Orkut contraria as leis da física e comprova que é possível mais de mil corpos ocuparem o mesmo lugar no espaço.

Como alguém vem falar que o lugar da literatura é no livro? É o mesmo que falar que o lugar do livro é na biblioteca. Seria a voz do meu avô avisando que só consegue ler na tipologia da máquina de datilografar? Ou é o homem que esqueceu que aprendeu a fazer fogo com as próprias mãos? Porque a literatura não tem lugar de ser nem razão. Não tem certidão de nascimento e nem de morte. Livro vira cinza. Internet é energia elétrica.

Literatura não tem pai nem mãe. Literatura é uma filha da puta que veio a vida pela própria conta e sem pedir licença. É uma santa que espalha seus milagres sem escolher quem vai receber. É a porra de uma hermafrodita celestial e reluzente distribuindo brilho por todos os lados.

Um blog não significa nada. O que ele transmite é o que significa. Meu amigo revela não ter grandes pretensões escrevendo no seu. Segundo ele, é mais para desafogar o MSN das pessoas. Senti que fosse uma direta pra mim. Sou daqueles que decreta chuva de poemas e envia não só mensagens pela internet, mas via SMS também. Penso que cada um tem sua forma de fazer arte.

Mas o blog não significa nada. O que significa é o que ele transmite. Ele me fala que usa a ferramenta mais como diversão rasteira. Mas por que rasteira quando ela é tem um alcance tão poderoso e profundo? Literariamente falando mesmo. A questão não é espaço? Nunca vi tanto espaço para explorar uma questão abertamente. Olho à minha frente e não vejo nada. É exatamente aqui que a internet faz caber tudo. Para mim isso não é apenas uma maravilhosa disruptura nos conceitos estabelecidos, é também um ponto de partida nunca antes alcançado na história da literatura.

Não que eu entenda tanto de literatura. E mesmo sabendo que definir não é melhor que sugerir, arrisco afirmar que a literatura é simplesmente pura elucubração linguística. Uma conspiração arquitetada nas entrelinhas da evolução da própria linguagem. Uma espécie de substância fomentadora e catalizadora da informação expressada na leitura que a existência faz dela mesma.

Meu amigo conta que se acha um assunto importante, ele fala mais sério no blog. A eleição, por exemplo, seria um motivo para maior seriedade. Aproveito a oportunidade e pergunto em quem ele vota para vereador. Ele diz que não vota para vereador. Eu digo que ele não vota, só trabalha com propaganda e escreve em blog. Ele diz que não acha que vereadores devem existir. Eu digo que ele trabalha com achismos. Ele diz que estou muito crítico. Eu digo que é estranho a falta de receptividade em um comunicador. Mas ele fecha a janela antes de ler o que eu sou.


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